segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Lembrar García Moreno

Gabriel Gregório Fernando José Maria García y Moreno y Morán de Buitrón, de origem aristocrática como revela o seu nome, foi duas vezes presidente do Ecuador, nos anos de 1859-1865 e 1869-1875, ano em que foi assassinado.

Personagem muito controvertido, foi amado e odiado ao seu tempo enquanto presidente, destacando-se no desenvolvimento das ciências e da economia no Ecuador, e por sua estreita relação com a Igreja Católica e com a Monarquia espanhola, o que contrariava os princípios basilares da República da qual era dirigente.

A biografia póstuma (mortografia, eu diria) de García Moreno me impressionou vivamente. Vários governantes infelizmente já foram assassinados, mas a história dele é única por vários motivos:

a) No dia marcado para o seu assassinato, na mesma hora, apareceram dois executores diferentes: um grupo de 4 homens armados com pistola, e um indivíduo chamado Faustino Rayo, armado com um facão (machete);

b) Aparentemente não havia relação entre eles, embora frequentemente a estória seja contada como "Faustino Rayo e seus comparsas".

c) A motivação deles era diferente: para Faustino Rayo a morte de García Moreno tinha finalidade de reparar a sua "honra". Conta-se que o presidente era amante da esposa dele e, para facilitar as coisas, deu a Faustino o cargo de governador de uma província longínqua.

d) O grupo de pistoleiros tinha motivação política, e considerando que o presidente havia sido eleito para o terceiro mandato, optaram pela forma não democrática de deposição.

e) Imaginem a cena: O presidente caminhando pelo corredor externo do palácio de Carondelet, quando de repente aparece um grupo armado. Ele sabia que ia morrer, pois já lhe haviam advertido. De repente, do outro lado do corredor, aparece um homem armado com um facão (Faustino Rayo), e começa a dar golpes nele, quatorze no total.

f) Conta-se que os pistoleiros correram assustados, mas depois voltaram para desferir 6 tiros. O presidente assim ferido, caiu ou foi empurrado do terraço, que ficava no primeiro andar. Não satisfeitos, os executores desceram e continuaram a atingi-lo. Nessa ocasião o presidente proferiu as seguintes palavras: "Dios no muere".

Entendo que, sendo católico fervoroso, a sua intenção evidentemente não foi comparar-se a Deus. Provavelmente estava se autoconfortando na hora da morte com a idéia de que, mesmo morrendo o seu principal defensor no Ecuador (o próprio García Moreno), Deus estava em boas mãos e ia continuar existindo.

Ou talvez ele nunca tenha dito tal frase, que foi acrescentada em sua biografia na tentativa de promover a sua canonização como defensor da fé.

g) Incrivelmente, o presidente não faleceu imediatamente. Foi levado à Catedral de Quito, onde recebeu extrema-unção, o que foi bom para a sua alma extremamente católica. Faustino Rayo foi imediatamente executado, e sequer lhe deram a chance de dizer o motivo da execução.

Tudo isso já faria de García Moreno um personagem inesquecível, candidato à pessoa mais assassinada de que eu já tive notícia. Mas a estória dele continua:

h) os padres que procederam aos ritos fúnebres tiraram um pedaço do seu crânio e o seu coração e guardaram. Depois, os restos mortais foram escondidos e ficaram perdidos até 1975, quando foram encontrados no Monasterio de Santa Maria Catalina em Quito.

i) A identificação positiva do corpo foi permitida pela aposição do pedaço do crânio, que encaixou perfeitamente.

García Moreno é um personagem muito complexo e merece ser lembrado: um presidente monarquista e católico de uma República laica, supostamente assassinado pela Maçonaria (?), por motivo passional e/ou político (?), patriota, amado por amigos e inimigos e odiado por amigos e inimigos, perdido, exumado e, finalmente, repousa em paz.

Um comentário:

  1. E tem até um perfil no facebook!
    Não acredita? Olha aí García Moreno "on memoriam" : http://www.facebook.com/pages/Gabriel-Garc%C3%ADa-Moreno/108440862514273

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