sexta-feira, 6 de maio de 2011

Trauma e memória coletiva viva: o caso Tapacurá

5 de maio de 2011, esse dia vai entrar para a memória dos recifenses, e esse post é um registro pessoal do caos de ontem.

Pessoas correndo desesperadas, abandonando os carros nas ruas, sofrendo pela antecipação do estouro da barragem de Tapacurá.

Se tem um evento que ninguém aqui esquece é a enchente de 1975. A cidade conseguiu superar a situação mas o medo de que aconteça novamente, e a necessidade de se antecipar a outra tragédia, criou uma situação estranha: basta imaginar que o rio está subindo para que os boatos comecem a correr, e a população se desespere.

O boato mais famoso até ontem havia ocorrido em 1976. O pânico na cidade foi geral, mas dá para entender porque fazia pouco tempo que a grande cheia havia ocorrido.

Ontem, trinta e cinco anos depois, essa memória coletiva traumática ressurgiu em forma de boato. E nós revivemos o pânico de 1976 em grande estilo: até a percepção dos sentidos foi obnubilada. As pessoas apontavam o rio, que realmente estava mais alto mas não estava transbordando, e simplesmente ficavam aterrorizadas porque ele estava transbordando.

Olhem e vejam: o rio não está transbordando. "Madame (essa sou eu, conversando com a pessoa), não está transbordando ainda, mas quando abrirem as comportas de Tapacurá..."

- Certo, e onde é que o senhor ouviu isso?

- É o que está todo mundo dizendo, madame...

Realmente, a nossa cidade não está preparada para nenhum tipo de emergência. Na verdade, não está preparada nem mesmo para o cotidiano, já que a infra-estrutura de habitação, viária, transportes públicos, abastecimento e esgotamento, entre outras tantas que supostamente fazem uma cidade, são flagrantemente deficitárias.

É por isso que a população se deixa levar por esse tipo boato, naquela sensação de cada um por si que caracteriza os abandonados. Para ver as repercussões do boatohttp://www2.uol.com.br/JC/sites/tapacura/materia_01.html

Como o meu interesse no caso é a memória coletiva, que neste caso está viva e bulindo com espasmos cíclicos, fiquei observando a movimentação das pessoas na rua, e sentindo a atmosfera elétrica do pânico e a tensão que estavam no ar.

Embora cética, observava o caos social sem me descuidar do rio, com um olho no padre e o outro na missa.

3 comentários:

  1. Hoje, caos de novo.

    Sempre mais do mesmo. E depois perguntam para que serve a memória coletiva...
    Para embasar políticas públicas de prevenção, ora essa.

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  2. 02 de maio de 2016, outro "Caos de Maio", causado pelas chuvas. E foi caos novamente porque não houve prevenção.
    De novo.

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  3. 27 de maio de 2022, outro "Caos de maio", agora com 94 mortos.

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