terça-feira, 19 de julho de 2011

Memória poética - Fernando Pessoa

Fernando Pessoa, porque cada dia a gente descobre outro poema lindo dele (inesgotável), meio confuso sobre lembrar e não lembrar:

Contra lembrar:

"Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rasto,
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.
A recordação é uma traição à natureza,
Porque a natureza de ontem não é natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.

Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!"

A favor de lembrar:

"Eu amo tudo o que foi
Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errônea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia".
_________________

De um lado ou outro do argumento, sempre belos poemas. Não é uma contradição e nem problema de identidade: o poeta, na minha modesta opinião, não precisa ser esse ou aquele, já que pode ser o que quiser com esse talento que tem.

Um comentário:

  1. "Nem sempre sou igual no que digo e escrevo.
    Mudo, mas não mudo muito.
    A cor das flores não é a mesma ao sol
    De que quando uma nuvem passa
    Ou quando entra a noite
    E as flores são cor da sombra.
    Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
    Por isso quando pareço não concordar comigo,
    Reparem bem para mim:
    Se estava virado para a direita,
    Voltei-me agora para a esquerda,
    Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés —
    O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
    E aos meus olhos e ouvidos atentos
    E à minha clara simplicidade de alma ..." Alberto Caieiro, que também era Fernando Pessoa.

    ResponderExcluir