Você pode não lembrar, mas quando eu cheguei aqui era tudo mato. Eu sou uma testemunha do mundo antes da internet.
Só tínhamos a televisão, com quatro canais para assistir. E só podíamos assistir aos nossos programas favoritos quando os deuses televisivos permitiam: o poder de reprodução não estava ao nosso alcance.
Eu sempre gostei de programas musicais de videoclipes, e a sensação era de tirar na loteria quando alguns dos meus preferidos passavam na tv (Ó Fortuna!). Lembro que fiquei absolutamente estupefacta quando vi pela primeira vez o videoclipe de California Dreamin' dos Beach Boys, pois já gostava dessa canção desde The Mamas and The Papas, e fiquei ali só ouvindo e admirando.
Depois, passei anos esperando que repetissem o videoclip, o que acontecia raramente para a minha profunda tristeza, até que um dia meu pai trouxe um videocassete para casa e eu, pelas estranhas razões do destino, consegui gravá-lo.
Hoje existe o Youtube. Se você for, basta colocar "Beach Boys" e "California Dreamin'" na pesquisa e, como grande felizardo contemporâneo, conseguirá ver videoclipe que eu persegui durante anos.
A mesma coisa com as pérolas de áudio. A gente esperava tocar na rádio e deixava a fita cassete engatilhada para gravar. Eu sempre perdia o início das músicas porque não era tão rápida no gatilho, e a pobre canção Sunday Morning do Bolshoi nunca conseguiu ser integralmente reproduzida.
Estudávamos por enciclopédias, e a minha estava dez anos atrasada. Sim, era uma época em que não havia computadores pessoais, e todo o nosso trabalho era feito à mão, como infinitos bordados de letrinhas.
O saber estava nas bibliotecas, e ao longo do tempo montei a minha. Chegou o tempo, entretanto, de deixar os meus livros seguirem adiante, e por isso estou me desfazendo dela. Eu não leio livros digitais, mas a cada dia tenho mais acesso e interesse pelo material disponível no mundo cibernético.
Quando a internet chegou era uma coisa muito bizarra e maravilhosa, no sentido de causar estranheza mesmo. Havia apenas aquela com um barulho insuportável de discagem, que demorava a vida toda para fazer alguma coisa, mas que nos permitiu enviar cartas quase imediatas.
E encontrar alguns documentos interessantes. E adquirir livros outrora impossíveis. Hoje, todas essas dificuldades são memórias, que eu conto para vocês que não viveram o período.
O mundo antes da internet era muito diferente: mais lento e palpável, menos interessante e acessível.
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