O brasileiro não tem memória.

Neste blog desmascaramos esta mentira.









sexta-feira, 30 de maio de 2014

O direito fundamental de ser esquecido

Como discutimos no post
 http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2010/10/o-direito-fundamental-ao-esquecimento.html, os indivíduos são titulares do direito ao esquecimento, englobando o cancelamento de registros e retirada da esfera pública.

Pois bem, o Google parece que está tentando efetivar o direito ao esquecimento individual: http://observador.pt/google-pergunta-nos-quer-ser-esquecido/.

É uma boa notícia para todos aqueles que, licitamente, se sentem incomodados pela sociedade de toda e qualquer informação.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Direito de ser sepultado X cremação

Se for verdadeira, essa notícia é de partir o coração: http://oglobo.globo.com/mundo/idosos-chineses-se-matam-para-nao-serem-cremados-12631819

A questão do direito ao sepultamento conforme as próprias crenças é muito delicada, porque determina e organiza o futuro do falecido, e consequentemente a maneira como será lembrado, marca a sua posição na sociedade e também afeta a família. Aparentemente, a tradição determina que os chineses devem ser inumados, e não cremados, e mudar abruptamente os costumes em um tema tão importante pode realmente trazer consequências sociais graves.

Aqui onde vivemos os costumes funerários também estão mudando, porém gradualmente.  No post http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/03/beber-o-morto.html comentávamos que o ritual do velório está mudando e se tornando cada vez mais rápido e impessoal, e algumas práticas já desapareceram ou estão em vias de extinção, como as carpideiras (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/01/carpideiras.html.

É importante garantir o direito de ser sepultado segundo as próprias crenças, dar às pessoas a chance de fazer o que é "certo" e necessário para fechar a existência da pessoa falecida, sem o que a sua biografia restará inconclusa, com prejuízo para a memória individual do falecido e dos vivos.

sábado, 24 de maio de 2014

Aniversário de Fabiana

Aniversários são uma importante comemoração individual, que relembra o natalício de um indivíduo, ou seja, a sua data de nascimento.  Como a nossa vida é medida em anos contados a partir desse marco, e essa contagem tem profunda significação social e jurídica, já que a idade condiciona a capacidade de exercício, é de se esperar que exista um ritual comemorativo.  Entre nós, o aniversário de 15 anos é o único que possuía  o caráter de "rito de passagem".

Aqui no Brasil os aniversários geralmente giram em torno de um bolo, mas não existe definição quanto à sua forma ou sabor.  Em geral, o gosto individual do aniversariante determina esses aspectos e, na dúvida, é só escolher um de chocolate que não há erro.

Há também o costume de fazer a decoração com balões coloridos e acessórios como chapéu, língua de sogra (um brinquedo de soprar), apitos.  É também uma oportunidade de entregar dádivas ao aniversariante em comemoração e confraternizar com os familiares e amigos.

O ponto culminante da comemoração é cantar a música tradicional conhecida como "Parabéns para você", acompanhada de palmas bem desencontradas.  Ultimamente, após essa tradicional cantilena, as pessoas passaram a acrescentar uma parte assim : "é pique, é pique, é pique, é hora, é hora, é hora, rá-tim-bum" "Fulano, Fulano, Fulano (nome do aniversariante gritado efusivamente)". Esse é realmente um momento de tensão, já que dificilmente essa parte é cantada de acordo com a moral e os bons costumes.

Hoje é o meu aniversário, e como é tradição, todos os anos a minha mãe relembra como foi o meu nascimento. Conta-se que ela foi três vezes ao hospital mas não conseguiu dar à luz.  Na quarta vez, achou melhor esperar um pouco antes de correr para lá de novo e, como Murphy e suas leis profetizariam, não deu tempo.

O fato é que eu nasci no elevador do hospital porque não deu tempo de chegar à sala de parto.  É fato também que, como eu demorei a nascer, minha mãe disse que eu estava toda roxa, e é por isso que na minha certidão de nascimento consta a "cor: morena".

Aliás, essa estória de "cor de pele" no Brasil merece uma profunda reflexão sociológica, que eu não fazer porque hoje é meu aniversário.  Mas se alguém tiver interesse de conhecer a diversidade de cores dos brasileiros, tais como, "morena jambo", "cor de burro quando foge", "fogoió",  vale a pena conhecer o trabalho de uma das minhas artistas plásticas favoritas, Adriana Varejão: https://catracalivre.com.br/sp/agenda/gratis/adriana-varejao-define-as-cores-dos-brasileiros-em-exposicao-na-galeria-fortes-vilaca/

A idéia dela foi muito interessante, desenvolver tintas que refletissem as cores indicadas pelos brasileiros no censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).  Pode ser mais legal que isso? http://guia.folha.uol.com.br/exposicoes/2014/04/1433660-de-fogoio-a-burro-quando-foge-artista-cria-tintas-inspiradas-em-tons-de-pele-brasileiros.shtml  .

sexta-feira, 23 de maio de 2014

terça-feira, 20 de maio de 2014

Aniversário do blog "Direito à Memória"

Em 17 de maio de 2014 nosso blog comemorou quatro anos (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2010/05/capitulo-1.html)!.

Ainda continuo achando interessante discutir os temas sobre a memória e o patrimônio cultural que a veicula, quatro anos e 704 posts depois, então continuaremos por aqui.


domingo, 18 de maio de 2014

O meu tempo

Há um ditado que diz:  "os homens se parecem mais com o seu tempo do que com os seus pais", e isso é bem verdade.  Outro não é o motivo para o choque entre gerações, a rebeldia adolescente (que envolve aspectos hormonais e de identidade), e aquela sensação de que pertencemos a uma época.

Por mais de uma vez, já me peguei falando que "no meu tempo" as coisas eram melhores e diferentes. Definitivamente, estou me tornado obsoleta de forma intencional, porque me recuso a acompanhar todas as novas tecnologias e modismos que surgem.

É claro que eu aceito algumas inovações. Eu até escrevo em um blog, pelo amor de Deus.  Mas há um limite para mim:  não tenho Twitter, não uso Instagram, só recentemente vi um tablet, e poderia ter passado o resto da vida sem vê-lo.  Uso o facebook para reencontrar os amigos e marcar encontros no mundo físico, compartilhar e discutir temas para a vida coletiva, e só.

Mas esse nosso tempo não é assim.  É o tempo da exacerbação do individualismo e da necessidade de exposição.  Foi criada uma necessidade de informar sobre aspectos da vida privada, ao ponto que as pessoas discutem as suas relações íntimas em público, através das redes sociais. E isso tudo é acompanhado de imagens.

Sem dúvida é tempo da chamada "Sociedade da Informação", o que não significa necessariamente um ganho para as relações humanas e a memória individual e coletiva.  Pelo contrário, o excesso de informação e a espécie de suporte (virtual) pode prejudicar, e muito, a memória desse nosso tempo.

É também um tempo assustadoramente conservador e autoritário.  A pressão social do grupo para moldar comportamentos - heteronomia - antigamente era reservada aos aspectos mais públicos da convivência, mas dada a crescente exposição da intimidade, agora atinge até aspectos que deveriam ser socialmente irrelevantes.  É claro que também há pontos positivos, e as redes sociais permitem  fortalecer os laços de coesão social e a discussão de temas políticos (não político-partidários note-se) importantes para nossa vida.

O meu tempo e o meu lugar têm seus mandamentos:

- Seja magro, de qualquer jeito;

- Seja "bonito", a qualquer custo.  Beleza física, em meu tempo, é literalmente uma forma de reconstrução do corpo.  Fico curiosa, e gostaria de estar lá para ver, os arqueólogos do futuro distante analisando os enterramentos desse nosso tempo, e encontrando todas as próteses de silicone espalhadas pelos esqueletos.

- Seja feliz, ou pelos menos aparente ser.

- Seja rico, e isso significa ostentar bens ou um estilo de vida glamouroso, ainda que à custa de endividamento.  Muito endividados, os "ricos" na verdade são pobres, porque o seu estilo de vida exige o consumo de muitos bens e, como diria o filósofo e Presidente José Mujica, "pobre é quem precisa de muito".

- Compartilhe aspectos da sua vida privada.  (Será que no Brasil as redes sociais fazem tanto sucesso porque na dicotomia público-privado percebemos melhor o segundo aspecto?).

- Cuide do meio ambiente, desde que não atrapalhe o seu estilo de vida e de consumo;

- Aproveite para consumir o planeta, porque o fim está próximo e a Terra tornar-se-á um lugar muito quente.  Nesse nosso tempo, chegamos ao fim das profecias mais antigas (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2012_12_01_archive.html), e o mundo, no fim das contas, não acabou em dezembro de 2012.  É o tempo em que os cientistas tornaram-se profetas.

É um tempo peculiar, mas também bem parecido com os outros porque a Humanidade continua fazendo o que sempre fez. Não chegamos à paz perpétua, e parece que não será no meu tempo que isso acontecerá.

sábado, 17 de maio de 2014

Justiça Federal afirma que os cultos afro-brasileiros não são religião

Custei a acreditar na notícia: http://compauta.com.br/7359/brasil/justica-federal-define-que-cultos-afro-brasileiros-como-a-umbanda-e-candomble-nao-sao-religiao/

Não vou realizar nenhuma análise técnica antes de ler a decisão, porque isso seria temerário, mas não restam dúvidas de que deve ser lida com muito cuidado e minúcia.  Por mérito próprio, já virou estudo de caso.

Vou aqui falar apenas de princípios e, o principal deles, proteger a liberdade das pessoas.  A liberdade de crença é uma conquista diária do povo brasileiro.  Como ocorre em qualquer liberdade pública - direito de primeira geração - o Estado deve abster-se de interferir.  Dizer por sentença quais são os "requisitos" para uma crença ser considerada religião, e consequentemente negar a proteção legal, pode significar uma interferência indevida na esfera da liberdade dos seus praticantes.

O objetivo da ação judicial aparentemente era retirar vídeos que atingiam a liberdade de crença dos praticantes de Candomblé e Umbanda. Se o artigo 5º, VI, afirma que é inviolável a liberdade de crença, atentados contra a ela não podem ser tolerados, ainda que essa crença não seja considerada "religião".

Vamos estudar.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Caso Riocentro - recebimento inédito de denúncia


Na ação movida pelo Ministério Público Federal, foi acatada a denúncia contra os Réus Newton Cruz, Nilton Cerqueira, Wilson Machado, Cláudio Guerra (do livro Memórias de uma Guerra Suja), Edson Rocha e Divany Barros.

Confira a informação processual (http://www.jfrj.jus.br/?id_info=8):

0017766-09.2014.4.02.5101      Número antigo: 2014.51.01.017766-5
Ação Penal - Procedimento Ordinário - Procedimento Comum - Processo Criminal
Autuado em 17/02/2014  -  Consulta Realizada em 15/05/2014 às 17:10
AUTOR     : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
PROCURADOR: ANTONIO DO PASSO CABRAL E OUTROS
INDICIADO : WILSON LUIZ CHAVES MACHADO E OUTROS
06ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro
Magistrado(a) ANA PAULA VIEIRA DE CARVALHO
Diretor Secretaria:  JOAO DE ALMEIDA RODRIGUES NETO
Distribuição-Sorteio Automático  em 17/02/2014 para 06ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro
Objetos: OUTROS CRIMES DO CODIGO PENAL; CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE E A PAZ PUBLICA; CRIME CONTRA A ADMINISTRACAO DA JUSTICA
EXISTEM 66 DOCUMENTOS APENSOS PARA ESTE PROCESSO.

O atentado conhecido como "Caso Riocentro" ocorreu em abril de 1981, portanto, não está abrangido pela Lei da Anistia, que é anterior.

terça-feira, 13 de maio de 2014

13 de maio - Abolição da Escravidão

A abolição da escravidão no Brasil é vista como um evento singular, cujo marco foi a edição da famosa Lei Áurea (cf. http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2011/05/sexta-feira-13-de-maio-uma-data-para.html).

Entretanto, a abolição não foi um evento, mas um longo, gradual e doloroso processo que culminou na edição da referida lei.

Recentemente, tive a oportunidade de estudar um pouco sobre esse lento processo, e cheguei a algumas conclusões interessantes.

A primeira delas é que a abolição é um excelente estudo de caso sobre procrastinação.  Em segundo lugar, também é extremamente útil para quem deseja estudar o caráter simbólico do Direito, e ver na prática como as normas podem ter uma eficácia oposta à intentio legis.

Começando pela norma que aboliu o tráfico negreiro, e que não surtiu efeito por uma conhecida fraqueza fiscalizatória.  Não havia estrutura ou intenção política de tornar efetivo o fim do tráfico.

Depois, a lenta e gradual abolição de categorias de escravos.  Começando por aqueles que participaram na Guerra do Paraguai, depois nascidos livres pela lei do Ventre Livre e finalmente, já idosos, libertos pela Lei do Sexagenário.

Em relação as essas duas últimas normas, as estratégias de procrastinação da liberdade são absolutamente engenhosas.  Observem:

Pela Lei do Ventre Livre (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM2040.htm), a criança nascia livre mas o dono dos frutos (civis) tinha duas alternativas.  Ou entregar o ingênuo (criança livre) ao Estado mediante uma indenização, ou manter o ingênuo como agregado, trabalhando gratuitamente até os 21 anos.   Conforme Treccani, apenas 188 ingênuos foram entregues ao Estado, o que mostra a pouca eficácia da Lei.

Então, na verdade a Lei não permitiu o nascimento de pessoas livres, mas de servos até os 21 anos de idade.

Já em relação aos sexagenários (http://linker.lexml.gov.br/linker/processa?urn=urn:lex:br:federal:lei:1885-09-28;3270&url=http%3A%2F%2Flegis.senado.gov.br%2Flegislacao%2FListaPublicacoes.action%3Fid%3D66550%26tipoDocumento%3DLEI%26tipoTexto%3DPUB&exec), considerando a expectativa de vida média ao redor dos 40 anos, percebe-se que na verdade houve pouca eficácia.  Em tempos em que não havia previdência social, o que faria um idoso  "livre" e desapossado?

E ainda temos que lembrar dos fundos de emancipação, criados pelo Estado para pagar a alforria dos escravos, com alegações de superfaturamento de preços e má-gestão.

Muitos comparam o processo brasileiro com a abolição norte-americana, e sua sangrenta Guerra Civil, destacando como fomos pacíficos e bem sucedidos.  De fato, o Brasil foi a última nação independente a abolir a escravidão, que entre nós durou 354 anos oficialmente, o que permitiu aos senhores de escravos usufruir das benesses do trabalho não assalariado por décadas, mesmo após a escravidão ser considerada ilícita no âmbito internacional.

É claro que três séculos deixam marcas profundas, e ainda hoje é possível ver os ecos dessa memória coletiva nas relações de trabalho no Brasil (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/02/memoria-brasileira-escravidao.html), inclusive no pouco valor social atribuído ao trabalho humano, considerado um dos pilares da ordem econômica na Constituição Federal (artigo 170).

sábado, 10 de maio de 2014

Direito à memória dos mortos: Machado de Assis e a questão da "facilitação"

Nessa semana fui surpreendida pela notícia de que alguns textos de Machado de Assis, começando pelo maravilhoso Alienista, e de outros autores brasileiros, passarão por um processo de "atualização" e "facilitação" do vocabulário.  A idéia é tentar tornar esses textos mais acessíveis a todos os brasileiros.  Confira a notícia: http://www.estadao.com.br/noticias/arte-e-lazer,patricia-engel-secco-defende-projeto-de-facilitar-obra-de-machado-de-assis,1164221,0.htm.

Essa proposta encontrou forte reação de alguns setores da sociedade brasileira, não porque a adaptação ou facilitação sejam novidades na Literatura, mas porque no caso específico de Machado de Assis ela não é necessária.  Tratando-se de um autor do final do século XIX, cujo estilo é simples e não utiliza de palavras preciosas, é perfeitamente inteligível para os leitores atuais.

A minha preocupação, evidentemente, é sempre com a memória.  Neste caso, dependendo da qualidade e da extensão das facilitações, podemos estar diante de uma violação da integridade da obra do autor, que é um dos direitos morais autorais previstos pela Lei nº 9610/96, observe-se:

Art. 24. São direitos morais do autor:
I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III - o de conservar a obra inédita;
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;
VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem;
VII - o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado.


Para autores como Machado de Assis, acredito que a violação da integridade da obra é uma forma de violação à sua memória. O direitos morais de autor são direitos inalienáveis, irrenunciáveis e transmissíveis aos herdeiros.  Esses herdeiros, por força do artigo 12 do Código Civil também são legitimados para defender a memória dos mortos.

 Infelizmente, não constam herdeiros por laços familiares, mas existimos nós, os herdeiros por laços culturais.

Não vou condenar a adaptação antes de ler.  Então, vou me deixar a tarefa de casa de reler o Alienista e depois comparar com a versão adaptada.  Vai ser um excelente estudo de caso, tenho certeza.

Para conhecer a obra completa de Machado de Assis, disponível na íntegra no sítio www.dominiopublico.gov.br: http://machado.mec.gov.br/index.php/obra-completa-mainmenu-123

O Alienista pode ser lido neste link: http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/contos/macn003.pdf

Para conhecer um pouco do autor: http://www.machadodeassis.org.br/



terça-feira, 6 de maio de 2014

As meninas sequestradas de Chibok

Custei a acreditar na notícia de que  mais de duzentas meninas nigerianas foram sequestradas por um grupo contrário à "educação ocidental", cujo nome parece significar exatamente isso - Boko Haram: http://www.opovo.com.br/app/maisnoticias/mundo/dw/2014/05/05/noticiasdw,3246095/radicais-islamicos-reivindicam-sequestro-de-mais-de-200-meninas-na-nigeria.shtml 

Segundo entendi das notícias, o sequestro é um manifesto contra o que o grupo entende como o "modo não-islâmico" de educação, e uma reafirmação do que entendem ser o papel das mulheres na sociedade.  Mulheres, na visão do líder do grupo, são feitas para casar ou serem vendidas como escravas (http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2014-05-05/lider-do-boko-haram-promete-vender-jovens-raptadas-na-nigeria.html).

Das minhas lições sobre a língua árabe, as belíssimas cultura e religiões islâmicas, não lembro de nenhuma regra, mandamento ou princípio que estimule maltratar seres humanos ou vendê-los como escravos.

Algumas meninas que conseguiram escapar afirmam que foram estupradas ou forçadas a casar.  É uma situação terrível, tão terrível que a sociedade nigeriana parece ter ficado em estado de choque, e só agora o Estado organiza alguma forma de resgate.

Mal comparando, essa situação me fez lembrar do episódio do "Rapto das Sabinas" que, fato ou lenda, é invocado como um dos marcos da construção do povo romano.  Nesse episódio, diz-se que os romanos precisavam de esposas e, diante da recusa dos vizinhos, resolveram tomar à força as suas mulheres, como ilustrado nessa bela escultura em Firenze:




Para os nigerianos talvez o "Rapto das Meninas de Chibok" também venha a representar um marco de fortalecimento do Estado.

domingo, 4 de maio de 2014

Reflexão de domingo: o modo de viver em condomínios

Este domingo está mais preguiçoso que o normal, e essa falta do que fazer exige que a cabeça funcione mais, para compensar.  Quem me olha assim, largada no sofá com o olhar distante, pode até pensar que eu estou fazendo nada, mas na verdade estou pensando bastante.

Hoje me peguei refletindo como é diferente esse nosso modo de viver urbano, em cidades lotadas.  Pensei bastante tentando me lembrar de algum agrupamento humano, aldeia  ou vila, que não tenha produzido alguma forma de arte, ou outros bens culturais materiais e imateriais, e cheguei à conclusão que na História da Humanidade, só o meu condomínio foi capaz dessa façanha.

Somos um grupo estranho, nós que vivemos em edifícios abarrotados.  Apesar de dezenas, às vezes centenas de pessoas viverem no mesmo espaço, não se pode dizer que há vida comunitária.  Não há laços entre os moradores do condomínio, com exceção dos eventuais cumprimentos (se você der sorte), problemas causados pela vizinhança ou gestão do cotidiano comum, sendo essa última traduzida e reduzida ao valor da contribuição mensal para o bem comum.

Fosse em outros tempos, a vida comunitária seria discutida ao redor de uma fogueira, as disputas seriam resolvidas por um membro legitimado, após um ritual de confraternização onde houvesse comidas e bebidas especiais.  Agora, essa mesma discussão ocorre em uma pequena sala do edifício, sem nenhuma cantoria ou dádiva, resumindo-se o ritual ao apregoamento dos presentes e da pauta.

Duvido, também, que algum funcionário da Antiguidade reclamasse com as crianças por fazerem pinturas rupestres e simularem técnicas de batalha e caça, como presenciei hoje.

Esse modo de viver desumanizado não gera identidade cultural.  Alguém aí já ouviu falar em "vestir a camisa do edifício em que mora"?.  Claro que não.  A vizinhança não é uma mera coincidência geográfica, mas o compartilhamento de uma origem, objetivos e destino comuns, praticamente ausente nos modernos condomínios. Se há exceções? Provavelmente.  Se vou procurá-las hoje? Claro que não.

Na próxima reunião, vou dar algumas sugestões para incrementar a pauta: talvez decorar aquela salinha antisséptica com seres mitológicos do nosso condomínio, tendo a minha figura como personagem central, já que fui a primeira das moradoras.  Devíamos levar comes e bebes, e criar rituais mais elaborados para a tomada de decisão além da insossa contagem de mãos.

Já para a pauta, eu sugiro, deveria ser composta de duas partes: a primeira, com essas questões normais de gestão que todos parecem considerar relevantes e a segunda, mais sutil, deveria ser escolhida por pitonisas (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2012/08/resgatando-instituicoes-antigasoraculos.html), ou pelo uso de artes divinatórias.

De fato, os condomínios produzem bastante lixo, que também é um produto cultural e possivelmente futuros artefatos arqueológicos.  Mas deve haver mais possibilidades dessa nossa convivência produzir bens culturais, caso contrário vou continuar acreditando que esses grandes edifícios são na verdade columbários .


sexta-feira, 2 de maio de 2014

Retorno de bens culturais: o caso dos Mantos Paracas (Peru)

Boa notícia: http://peru21.pe/actualidad/textiles-paracas-recuperados-gotemburgo-llegan-junio-al-peru-2181019

É muito importante que os bens retornem ao local de origem, porque o princípio da conservação in situ tem também por finalidade contribuir para a construção e fortalecimento de identidades culturais.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

1º de Maio - Dia do Trabalho

O dia do Trabalho é uma data que integra o calendário oficial do Brasil, sob a forma de feriado, instituído através do Decreto nº 4859 de 1924: http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=44740&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB, que assim dispõe:

Artigo unico. E’ considerado feriado nacional o dia 1 de maio, consagrado á confraternidade universal das classes operarias e á commemoração dos martyres do trabalho; revogadas as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 26 de setembro de 1924, 103º da Independencia e 36º da Republica.

Posteriormente a  Lei nº 7466/86 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7466.htm) estabeleceu que deve ser comemorado na data em que cair, não devendo ser antecipado.

Observe-se que não é uma data comemorativa do "trabalhador", como muitas pessoas por aqui denominam, mas do trabalho em si, cuja valorização é um dos fundamentos da ordem econômica, como dispõe o artigo 170, caput, da Constituição Brasileira.

Não há um ritual e nem qualquer tipo de reflexão pública sobre a data e, se der praia, é para lá que a maioria dos brasileiros tentará ou sonhará ir.  Nunca presenciei nenhuma comemoração celebrativa da memória dos mártires do trabalho.

Existem outras datas comemorativas do trabalho ou do trabalhador que não são feriados, todas instituídas por Lei, por exemplo, os  trabalhadores rurais têm a sua data comemorativa em 25 de maio: http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/LEIS/1950-1969/L4338.htm.

Há também datas comemorativas de "combate":  28 de janeiro - Dia Nacional de combate ao trabalho escravo (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12064.htm); 12 de junho - Dia Nacional de combate ao trabalho infantil (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Lei/L11542.htm).  Há também uma data destinada à memória das vítimas de acidentes de trabalho, comemorado no dia 28 de abril (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11121.htm).

Como se pode perceber, sendo feriados ou não, cada uma dessas datas demandou que o Poder Legislativo Nacional elaborasse uma lei específica.  Se esses marcos não são comemorados, indagamos qual a finalidade do seu estabelecimento.

Se a idéia é que funcionem como marcos de ações governamentais específicas, especialmente de sensibilização e educação, então seria interessante verificar a sua eficácia para evitar que continuem como iniciativas meramente simbólicas.