Já que eu não brinco mais carnaval - renunciei à folia há muitos anos- resolvi ficar em casa pensando sobre o assunto.
Estou analisando o caráter memorial da festa, a partir de outros aspectos tradicionais como o tipo de fantasia (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/02/fantasias-de-carnaval-reflexao-e.html), as músicas, por exemplo.
Fico surpresa em perceber que, ano após ano, nós continuamos a cantar e a nos emocionar com músicas compostas no final do século XIX e início do século XX.
Quantas vezes, meu bom Deus, testemunhei pessoas temulentas (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2011/11/resgatando-xingamentos-antigos-7.html) e emocionadas, levantarem os braços e, em lágrimas, cantando "Bandeira Branca" (https://www.youtube.com/watch?v=RQLhK7sLvzY). Ou seja, faz décadas que essa música tão triste embala a folia de forma, no nosso modesto entender, totalmente incoerente.
Bem, incoerente mas compreensível, já que no carnaval há todo tipo de folião, inclusive aqueles que estão padecendo de nostalgia mas que, por dever cívico, estão participando da festa.
Depois dizem que o "brasileiro não tem memória"... Como? As pessoas passam o ano inteiro sem ouvir essas músicas (com raríssimas exceções), e quando chega a época do carnaval elas ressurgem das cinzas de confetes para obrigatoriamente serem executadas nos salões e nas ruas.
Essa resiliência das marchinhas de carnaval deveria ser estudada, se já não o foi. Especialmente daquelas que são incompatíveis com os valores atuais, mas a despeito disso, continuam sendo cantadas ano após ano, por exemplo, "o teu cabelo não nega" (http://www.youtube.com/watch?v=C36_dl1W72Q) e "cabeleira do Zezé" (https://www.youtube.com/watch?v=YpPFBjaAzF4).
Não sou de defender a censura, nem vou dizer que essas marchinhas devem ser proibidas (jamais). Mas defendo que se faça uma reflexão sobre esses conteúdos porque a memória coletiva autoritária é transmitida através desse tipo de veículo (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2012/05/memoria-coletiva-e-autoritarismo.html).
Evidentemente que esse tipo de reflexão não será feita nesse período momesco, para educar pessoas temulentas. Deverá ser feita em oportunidade adequada, através da educação na família, escola e ambientes de trabalho, de forma contínua.
Vejam os vídeos do youtube cujos links indiquei ao longo do post. São imperdíveis.
Bom carnaval!
"Mas como a cor não pega, mulata,
ResponderExcluirMulata eu quero o teu amor"...
????
Sobre a cabeleira do Zezé (afinal, ele é?)
ResponderExcluirÉ o que mesmo?
E o refrão: "corta o cabelo dele!" "corta o cabelo dele!". Zezé não pode ter o cabelo de sua escolha?
Vê que coincidência: semana passada Zé me perguntou na grande: "- Quantas musicas de carnaval um brasileiro sabe cantar de cor?"
ResponderExcluirEu tô até agora pensando. Porque entre as que a gente sabe, tem aquelas que a gent nem lembra que sabe até alguém começar a cantar do lado. Ex: Ala, la, ô, mas que calor, ôôôô...
E tu, quantas tu sabes cantar de cor (ação)?
Essas marchinhas tradicionais a gente sabe cantar todas, ainda que de forma incompleta.
ResponderExcluirNessas décadas que ando sobre esta terra, já ouvi tanto essas músicas sazonais que não há como deixar decorar.
O fato é que a minha memória carnavalesca parou no ano 2000, quando deixei de brincar carnaval.
Até essa data, eu montei na lambreta, desci na boca da garrafa, agitei a bandeira branca, imitei os faraós e faranis da folia, pintei o sete.
Não dá para quantificar.
Ele me disse q hà uns doidos estudando o efeito desses aparelhos de MP3/4 da vida sobre a memoria musical das crianças. Algo assim como: porque hoje em dia todo mundo carrega consigo uma porrada de musica nesses aparelhos, as novas gerações perderam o interesse de decorar letras de musicas. Na pesquisa, nenhuma criança sabia nenhuma musica completa de cor, nem mesmo dos seus cantores preferidos. E perguntados o porquê, eles dizem que podem a qq momento escutar a musica ou achar a letra escrita na internet.
ResponderExcluirSerà? O que tu achas?
Denise, "decorar" é saber "de coração". Provavelmente haverá aquelas músicas que serão memorizadas independente da facilidade de obtê-las, simplesmente porque falam mais à alma e ao coração das pessoas. Cantarolar também é uma forma de exercer a lembrança.
ExcluirO fato de serem antigas não significa, necessariamente, que são cantadas corretamente. Palavras antigas e pessoas bêbadas nunca são uma boa mistura.
ResponderExcluirComeçou o desfile das músicas centenárias e sazonais. Interessante como elas falam à alma. Fazem parte da trilha sonora da minha vida.
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