O Direito Brasileiro tem problemas crônicos de efetividade, assim entendido o poder de realizar concretamente os comandos normativos.
Dizendo de outra maneira: o Direito é um instrumento, e como tal deve funcionar para o propósito a que se dispõe. No caso a finalidade é regular e estruturar as relações interpessoais, de modo que sejam "normais", "padronizadas", punindo aquelas que são "desconformes". Essa é a síntese mais simples.
Se o Direito não funcionar, não moldar efetivamente as relações interpessoais, então ele não é útil. E o que acontece com os instrumentos inúteis? Acabam no lixão físico ou simbólico, tal sapato velho, colher quebrada e xícara sem asa.
A questão é saber porque as normas não são efetivas. No Direito Brasileiro há "leis que pegam" e "leis que não pegam". Quais fatores fazem uma lei pegar? Quais fatores determinam a sua pouca pegação?
Os fatores são variados e se inter-relacionam, tornado o fenômeno complexo. Entretanto, hoje escolhi um desses fatores para iniciar a discussão: a falta de educação normativa do brasileiro.
Sei que é lugar-comum falar do "problema da educação no Brasil" mas, efetivamente, os brasileiros em geral não são educados para cumprir normas. E não há, ao longo de nossa existência como cidadãos, uma política pública educacional para estimular (avivando a memória) o cumprimento preciso das normas.
Ao contrário, a nossa memória coletiva guarda alguns valores esquisitos em uma República Democrática de Direito: no Brasil, quem cumpre regras rigorosamente é logo apelidado de caxias, otário, esquisito.
Essa deficiência na educação normativa do cidadão faz com que cada um tenha uma maneira muito criativa de interpretar as normas sociais, que acabam sendo cumpridas lá do jeito individual mesmo, e às vezes em detrimento do coletivo.
Vamos concordar que é difícil exemplificar a "educação normativa como variável negativa da efetividade do Direito". Então resolvi desenhar:
Olha aí uma norma simples na maioria dos cantos do globo: um semáforo que indica Pare, atenção e siga:
Olha essa norma gráfica na nossa interpretação, esse jeitinho brasileiro de ver a norma:
Analisando: Vermelho - Pare
Vermelho-amarelado: o sinal já ficou vermelho há um tempo considerável, mas mesmo assim há quem resolva ultrapassar.
Amarelo-avermelhado: o sinal está vermelhinho há pouco tempo, então não faz mal passar, especialmente se considerarmos que o brasileiro só anda atrasado e é quase atavicamente impontual.
Amarelo - Atenção!
Amarelo-esverdeado - Atenção reduza (para poucos)
Verde-amarelado: o sinal já está amarelo, mas há pouco tempo, então a regra é ACELERAR!!.
Verde. Siga. No caso do trânsito brasileiro é Sigo e se dane quem estiver na frente.
Vermelho-esverdeado: O sinal está vermelho há muito tempo, mais tempo do que qualquer outro sinal vermelho de bom-senso ficaria, então é hora de passar, porque todo mundo faria o mesmo.
Não é que o brasileiro não cumpra normas. O problema é que no Brasil a norma não é cumprida com precisão, as pessoas inventam motivos e pretextos para flexibilizar a aplicação e o cumprimento, devido à falta de educação normativa.
Hoje presenciei a corroboração da criatividade normativa do brasileiro.
ResponderExcluirUm veículo que estava à minha frente não conseguiu passar o sinal, que estava verde, em razão da grande quantidade de veículos que havia e não se pode fechar o cruzamento.
Quando a fila andou o suficiente para que o veículo à minha frete pudesse andar, ele foi, independentemente do sinal agora encontrar-se vermelho.
E assim, assisti ao surgimento de uma nova categoria: o direito adquirido ao sinal verde.
Os engarrafamentos da minha cidade, à míngua de qualquer benefício, pelo menos me permitem meditar.
ResponderExcluirHoje percebi que a buzina é, entre nós brasileiros, ou uma sanção social ou uma manifestação do direito de expressão (sob a forma de reclamação barulhenta).
Punem-se os maus motoristas com buzinaço, e reclama-se da vida do mesmo jeito.
Hoje fui xingada porque parei em um semáforo. É impressão minha ou a regra mudou, e agora "vermelho" significa siga?
ResponderExcluirAqui as normas jurídicas são cumpridas ao sabor da conveniência privada. É surpreendente o pouco valor que se dá ás normas e ao seu cumprimento sistemático e suficiente.
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