O esquecedouro é um lugar de esquecimento. E "esquecimento" não é apenas a falta de lembrança, pode significar também a privação de reconhecimento e exercício de direitos.
Em outros posts falamos sobre lugares de esquecimento, criados com essa específica finalidade: L'Oubliette francesa (http://direitoamemoria.blogspot.com/2011/06/esquecedouros.html), disappointment room, a roda dos enjeitados (http://direitoamemoria.blogspot.com/2011/06/esquecedouros-roda-dos-enjeitados.html), o lixão (http://direitoamemoria.blogspot.com/2011/06/esquecedouros-lixao.html).
Há também locais criados sem essa finalidade específica, mas que por questões culturais tornam-se esquecedouros: é o caso dos asilos no Brasil (http://direitoamemoria.blogspot.com/2011/07/esquecedouros-asilos.html porque a nossa sociedade, em geral, não valoriza o idoso. Foi preciso até criar uma lei especial - o Estatuto do Idoso - para garantir-lhes direitos inerentes a qualquer indíviduo, em qualquer fase da vida.
As prisões são outro exemplo de lugar transformado culturalmente em esquecedouro. Embora a legislação brasileira pretenda que sejam um ambiente de reabilitação social e reeducação, na verdade quando os comandos normativos são concretizados percebe-se que ocorre o oposto da vontade legal.
Do jeito que foram construídas fisica e simbolicamente, as prisões brasileiras não realizam a vontade legal de reabilitação, mas a vontade de vingança social, de retribuição do mal, no sentido normativo do termo. E isso é compatível com cultura brasileira, porque as instituições são criadas à imagem e semelhança da nossa mentalidade.
Recentemente fui ministrar uma aula sobre bens públicos, e tomei uma penintenciária como estudo de caso para gestão, fazendo um comparativo com determinada prisão estrangeira que, na indignação dos meus alunos, parecia "um hotel de luxo". Os presos tinham celas individuais limpas e adequadas, boa comida, um espaço para a prática de esportes e iam permanecer assim pelo tempo de reclusão determinado em sentença.
A indignação de muitos alunos decorria do fato de que estavam levando uma "boa vida", melhor do que a de muitos trabalhadores honestos. E eu questionava: a penalidade é de reclusão, e não de reclusão em um inferno. A lei não quer que as pessoas sejam maltratadas, e se assim quisesse, a nossa Constituição Federal devia prever castigos corporais e penas infamantes, que são proibidas no nosso sistema.
As prisões medievais e renascentistas possuíam péssimas condições estruturais e de salubridade, mas talvez isso se explicasse (não justificasse) pelo seu caráter temporário. As pessoas permaneciam presas enquanto a sua pena não era estipulada: banimento, morte, castigos corporais. A reclusão, portanto, era um meio, não um fim em si mesmo.
A reclusão passou a ser uma penalidade autônoma recentemente (acredito que a partir do século XVIII ou XIX) , com a explícita finalidade de apartar o criminoso da sociedade por razões de segurança e proteção. A questão é: a reclusão , tal como é praticada, consegue cumprir o que lei deseja?
Não, porque sequer o apartamento da sociedade é realizado forma eficiente, já que a tecnologia permite aos reclusos continuar integrando os seus meios sociais através de telefones celulares, por exemplo.
Por tudo isso, acredito que as prisões são esquecedouros. Locais onde são esquecidos os direitos fundamentais do cidadão, são esquecidas pessoas (inclusive quanto ao extrapolamento do cumprimento prazo das sentenças), e são também esquecidos valores que sociedade brasileira deveria cultivar, principalmente a dignidade da pessoa humana, em troca do atual sentimento de vingança.
E é exatamente por isso que a política carcerária brasileira está sendo questionada: http://agencia-brasil.jusbrasil.com.br/politica/103737711/violacoes-de-direitos-humanos-nos-presidios-anibal-bruno-e-urso-branco-sao-discutidas-na-oea
ResponderExcluirEstá sendo julgado em abril de 2013 o caso do "Massacre do Carandiru", que era um presídio situado na cidade de São Paulo. 111 presos foram mortos em uma ação policial.
ResponderExcluirEnquanto isso, na Holanda, discute-se o fechamento de presídios porque "faltam criminosos" para ocupá-los. Aparentemente, o sistema de monitoramento por tornozeleiras têm sido eficaz, e pode substituir com sucesso o encarceramento, evidentemente para alguns tipos de crimes.
ResponderExcluirA medida têm causado protestos da população, que teme o desemprego, e também da oposição porque a sua função é essa. A função da oposição é, exatamente, lançar a luz através de questionamentos e, sem ela, a unanimidade burra corre o risco de instalar-se.
Ontem, 25 servidores públicos foram condenados a 624 anos de prisão pelo Massacre do Carandiru.
ResponderExcluirCf. a notícia http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,justica-condena-pms-a-624-anos-de-prisao-pelo-massacre-do-carandiru,1060204,0.htm
ResponderExcluirTantos relatos de torturas nas prisões brasileiras. E vão continuar ocorrendo até que a história completa seja contada. E contar história completa significa esclarecer o que aconteceu com os culpados e informar quais foram as medidas preventivas adotadas.
ResponderExcluirNessa semana, mais uma vez, foram apresentadas imagens de adolescentes sendo espancados em uma unidade de reeducação para menores infratores. E mais uma vez, todo mundo ficou surpreso.
ResponderExcluirParece que os exemplos anteriores são sempre esquecidos.
Do Maranhão ao Rio Grande do Sul. Nessa semana tivemos o desprazer de ver e ouvir mais uma vez sobre o estado calamitoso dos presídios, penitenciárias, "unidades de reeducação", sem falar dos manicômios judiciários. Essa história não muda.
ResponderExcluirComplexo prisional de Pedrinhas, no Maranhão. Nota no blog para não esquecer.
ResponderExcluirUm homem teve o seu direito à liberdade concedido em 1989, mas só foi colocado em liberdade em setembro de 2013. Cf. http://www.ovp-sp.org/noticias_violencia_policial/not_vp_0159.htm.
ResponderExcluirFoi esquecido na prisão.
Complexo prisional de Pedrinhas no Maranhão. Mais três mortes desde ontem (30 de junho de 2014). Neste ano, foram 14 pessoas assassinadas lá.
ResponderExcluirO Brasil tem uma penitenciária ou presídio que possa ser chamada de modelo?
ResponderExcluirO Brasil possui algum presídio ou penitenciária que possa ser considerado modelo? Em caso negativo, precisamos urgentemente de um padrão ou parâmetro que seja considerado aceitável.
ResponderExcluirCf. http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/mais-dois-presos-sao-encontrados-mortos-em-pedrinhas
ResponderExcluirJaneiro de 2015, época da posse de novos governantes do Brasil. Em seu discurso de posse, uma autoridade diz que vai implementar mudanças drásticas no sistema prisional da região, proibindo o uso de celulares, armas e o ingresso de prostitutas no presídio, além de aumentar os muros da prisão para evitar fugas e que sejam jogados objetos por cima. Realmente, parece ser um novo modelo prisional para o Brasil, sem celulares, armas, sem a possibilidade de entrada de prostitutas e com muros adequados.
ResponderExcluirJulgamento histórico hoje RE 593581 sobre o mínimo digno nos presídios brasileiros. 13/08/2015
ResponderExcluirJulgamento histórico, mas em um sentido diferente. O Tribunal de Justiça de São Paulo anulou as condenações do Massacre do Carandiru, e ainda foi aventada uma "legítima defesa": http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2016/09/27/para-entidades-decisao-do-tj-sobre-juris-do-carandiru-e-reves-da-justica.htm
ResponderExcluirMais uma chacina em um presídio brasileiro. Agora, em Manaus. http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,onu-pede-investigacao-imediata-sobre-presidio-de-manaus,10000097853
ResponderExcluir56 mortos.
ResponderExcluir"Acidente pavoroso".
ResponderExcluir33 mortos, em um presídio de Roraima: http://oglobo.globo.com/brasil/pelo-menos-33-presos-sao-mortos-na-maior-penitenciaria-de-roraima-20736234
ResponderExcluir3 mortos, em um presídio no Rio Grande do Norte.
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