O brasileiro não tem memória.

Neste blog desmascaramos esta mentira.









quarta-feira, 22 de junho de 2016

Memória coletiva e autoritarismo (5): a redução bipolar

O raciocínio "nós" contra "eles" é fundamental para o estabelecimento das fronteiras e da soberania dos Estados.  A diferenciação por oposição é uma circunstância histórica e uma necessidade.

Mas quando a diferenciação por oposição é utilizada para negar a diversidade, as alternativas de desenvolvimento e identificação, minando a construção de uma democracia inclusiva e plural, estamos vendo mais uma forma de autoritarismo enraizada na memória coletiva brasileira.

A última manifestação desse autoritarismo, cuja origem pode ser rastreada, é a divisão de dois partidos (não escolas) de pensamento criados em função da crise no Brasil: os coxinhas e os ptralhas. Parece não existir uma terceira opção (ou vigésima), ou se existe, é sumariamente negada pelo discurso que enquadra forçadamente as pessoas em uma das categorias.

A clareza quanto a quem é o inimigo em uma guerra é fundamental. Mas a discussão política democrática é o oposto da guerra.  É o diálogo, entre nós, inexistente.

Não há diálogo quando não se quer ouvir o que o outro expressa. Não há diálogo quando parte-se do pressuposto de que tudo o que o outro fala está errado.  Não há diálogo quando as necessidades do outro são irrelevantes e a sua opinião passível de sumária desconsideração.

Não há diálogo quando a estratégia é o argumento ad hominem.  Desconsiderar a pessoa por qualquer motivo (geralmente manifestado sob a forma de xingamento) é uma falha grave em qualquer debate.

A briga motivada por política estremeceu relações públicas e privadas simplesmente porque as pessoas não conseguem dialogar.  Médicos recusaram atendimento a pacientes por causa de sua crença política, familiares brigaram por causa de política partidária, relacionamentos foram prejudicados de forma indelével.

Evidentemente, os valores e as crenças de uma pessoa vão moldar os seus relacionamentos, e muitas de forma definitiva.  Para mim, não seriam a religião, a crença política (salvo poucas desonrosas e indefensáveis doutrinas), ou outra inclinação individual que afetaria o meu apreço por alguém, mas o seu caráter e honestidade.

Muito menos questionamentos relativos à capacidade econômica ou educação formal. Ricos honestos e desonestos. Pobres honestos e desonestos.  Pessoas sem instrução que são educadas e honestas, e doutores que não.  A falácia da generalização deixa de ser apenas um problema lógico e passa a ser uma relevante questão ética quando se trata de classificar pessoas e prejudicar seus direitos (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2012/05/memoria-coletiva-e-autoritarismo.html).

Deveríamos discriminar os desonestos de qualquer partido ou religião.  Gente que abusa da boa-fé alheia em qualquer relação pública ou privada, e não admitir violações às liberdades das pessoas. Liberdade de acreditar ou não, de se expressar responsavelmente, de criação artística e manifestação do pensamento, que são o remédio para a violência autoritária que macula a nossa memória.

Gente safada X Gente honesta deveria ser o nome do jogo, e essa é a única redução bipolar que eu admito.

Parar para pensar, refletir e tentar compreender a argumentação do outro, e só então tomar posição, é uma conquista da maturidade política.  Até lá, só há xingamentos, bullying, e o ladrar daqueles que não se dão ao trabalho de parar para pensar e só conseguem se relacionar negando a cidadania do outro.


terça-feira, 21 de junho de 2016

domingo, 19 de junho de 2016

Olímpíadas modernas no Brasil (2016)

Quem sou eu para reclamar, se mesmo os gregos fizeram uma Olímpiada moderna em Atenas? Vocês podem imaginar o que eu senti quando vi a maratona ser iniciada lá, em Maratona?

Mas embora esse renascimento seja um desejo que afeta algumas gerações efetivamente muito pouco existe de similaridade entre os jogos antigos e os modernos. A comparação serve para ressaltar as diferenças, e a estratégia de religação com o passado, nesse caso, parece uma impossível continuidade discursiva (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2011/06/time-maps.html). Se nem a Grécia é a mesma, quanto mais os jogos.

Se o espírito olímpico existe, sobreviveu ao tempo e motiva a ressurreição da idéia de confraternização, sem dúvida globalizou-se, adquiriu ares empresariais e está praticamente irreconhecível, comparado àquele que inspirou os primitivos (originais) jogos.

E sem dúvida, não será mais o mesmo após as Olímpiadas no Brasil. O espírito olímpico envelhecerá e sairá com cicatrizes e questionamentos existenciais profundos, se dessa vez os oráculos do apocalipse estiverem certos.

Em 2014, o Brasil sediou a Copa do Mundo que foi um sucesso televisivo, muito emocionante.  Mas parece que ela ainda não acabou, já que inúmeros questionamentos quanto à corrupção da FIFA e de algumas federações de futebol contribuem para empanar o brilho do evento.

Para nós,brasileiros,  a copa ainda não acabou.  Na minha cidade, por exemplo, muitas "obras da Copa" continuam inacabadas, o que nos leva à uma conclusão rápida e óbvia de que não eram necessárias (já que o evento ocorreu sem elas) e que o gasto de dinheiro público não se justificava.

Vamos pontuar alguns aspectos interessantes para começar essa reflexão, que vai continuar ao longo do evento:

1) Não houve,até o momento, um movimento popular do "Não vai ter Olimpíadas", diferentemente do que ocorreu com a Copa.

Se o evento corre o risco de não acontecer é por fatores outros, mais politico-institucionais, ou administrativos, por exemplo, a não conclusão das obras necessárias.

2) O Estado do Rio de Janeiro, sede das Olimpíadas, decretou "estado de calamidade pública", por questões financeiras (http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/06/especialistas-comentam-decreto-de-calamidade-publica-no-rj.html), arriscando o evento.

Essa é realmente uma novidade, já que a calamidade pública para esses fins geralmente liga-se a eventos naturais.  Os efeitos dessa decretação, esses sim bem conhecidos, visam a afastar a necessidade de licitação para a contratação de obras e serviços e forçar a liberação de recursos federais.

3) Algum dia, alguém talentoso contará a estranha e maravilhosa jornada da tocha olímpica no Brasil.

4) A segurança pública é sempre uma questão. O nível ou padrão (standard) do que se considera boa segurança no Brasil é muito diferente do adotado em outras nações onde houve Olímpiadas.  Aqui funciona com zonas de exclusão, com encastelamento de residências e a criação de fossos, que podem ser materiais ou simbólicos (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2012/02/resgatando-instituicoes-antigas-fosso.html).

Será necessário criar uma bolha e confinar os atletas e turistas para protegê-los.

5) Questionamentos judiciais sobre o denominado "legado olímpico".
Cf. http://agenciabrasil.ebc.com.br/rio-2016/noticia/2016-07/justica-federal-exige-apresentacao-de-legado-da-olimpiada


6) Aparentemente, haverá um "déficit de representação" por autoridades no evento.  Algumas já informaram a ausência por motivos variados, tais como, princípios, temor, discordância política, etc...


7) No dia da abertura (05/08), houve protestos contra o evento, mas principalmente contra a situação governamental em vários níveis da Federação.

8) As manifestações do direito à expressão foram limitadas durante o evento.  Discutir qual é o limite das limitações será um exercício interessante.

9) O Rio de Janeiro continua lindo.

10) Gostaria de destacar como ponto positivo na transmissão dos jogos, o fato de que em algumas modalidades os locutores nos estádios explicam um pouco da regra e da pontuação.  Dessa forma, quem não conhece o esporte pode aprender e torcer. Eu, por exemplo, estou viciada em tiro com arco.

11) O brasileiro vai torcer, não importa o que está em jogo. Impeachment, esgrima, romance, outra modalidade que a gente só descobriu que existe nas Olímpiadas.  Não importa.  O brasileiro escolhe um lado, e vai.

Também não importa se o atleta ou se o país não é nosso conhecido.

12) É tão bom ver o esporte em sua melhor forma.  Olhando os jogos dá vontade de praticar todas as modalidades porque parece tão divertido, e os atletas olímpicos parecem saber o que estão fazendo. Evidentemente, eu gostaria de começar a praticar já com nível de atleta olímpico, porque ser iniciante às vezes é frustrante.

13) Muitos lugares vazios nas arquibancadas, de partir o coração.  Cf. http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/olimpiadas/rio2016/noticia/2016/08/comite-organizador-diz-que-ingressos-para-olimpiada-nao-estao-encalhados.html

Por muitos motivos, comparecer às Olimpíadas é para poucos.

14) A primeira parte dos jogos olímpicos terminou ontem, 21/08/2016.  Vamos para a segunda.

15) Nessa primeira parte, assim como aconteceu durante a Copa, quem assistiu aos jogos pela televisão achou que tudo funcionou bem, na medida do possível.

16) Os jogos olímpicos foram dignos e divertidos.  Acredito que para alguns atletas, será uma das melhores lembranças de toda a vida.

17) Além da incrível qualidade dos atletas, dos jogos, a primeira parte do evento vai ficar marcada pelo que não aconteceu.  Não aconteceu nenhum desastre, não houve atentado terrorista e os atletas americanos não foram assaltados.

18)  Infelizmente, o técnico alemão Stefan Henze, da canoagem, faleceu após um acidente de trânsito.

19) As Olimpíadas continuam no Rio de Janeiro.  Infelizmente a abertura da segunda parte dos jogos não foi transmitida pela tv aberta.

20) O Rio de Janeiro continua lindo.

Esse post continua...

sábado, 18 de junho de 2016

Divulgação - Edital "Direito à memória e à verdade nas escolas" - Prefeitura de São Paulo

Idéia interessante: promover iniciativas educacionais inovadoras tendo por tema o direito à memória e à verdade.

Olha o edital: http://media.wix.com/ugd/e15207_8724a9676f984decbb0c77f34a269fa0.pdf

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Diálogo surreal (12): sobre comemorações

- Daqui a um mês comemoramos cinco anos de casados.
- CINCO ANOS de casados? Uau!  Passou depressa.
- ...
- É no próximo mês?
- É.
- Que dia?
- Você não lembra a data em que a gente casou?
- Lembro, claro.  Só queria confirmar... É daqui a um mês exatamente?
- É.
- Que dia é hoje?
- 15.
- Lembrei, a gente casou no dia 15.
- É verdade.... qual o mês?
- Em que mês a gente está?

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A vida está passando tão depressa que nós não podemos deixar as grandes datas ao sabor do esquecimento individual.  Seja proativo (a), como eu, adote estratégias eficientes para que o marco seja devidamente comemorado  e evite a frustração de quem acha que a lembrança espontânea é um ato de amor.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Citações sobre a memória - Michel de Montaigne

"Nada fixa alguma coisa tão intensamente na memória como o desejo de esquecê-la".

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Porque o desejo de esquecer, evidententemente, é uma espécie de reafirmação.


domingo, 5 de junho de 2016

Prêmio Camões - Raduan Nassar

O escritor brasileiro Raduan Nassar venceu a edição 2016 do prestigiado "Prêmio Camões".  A sua obra publicada em Português é quantitativamente pequena, apenas três livros,mas a qualidade é gigantesca (cf. http://www.dn.pt/artes/interior/raduan-nassar-o-premio-camoes-que-defendeu-dilma-5201035.html).

Fiquei muito interessada pelo premiado, ao ponto de comentar aqui no blog, por questões subjetivas e objetivas.  Sem dúvida, autor e obra são muito originais e peculiares.

O sujeito - Raduan Nassar - parece ser o contraponto do nosso tempo.  Não se expõe, dizem que é recluso, mas acho que só quer distância do ruído para trabalhar em paz.

E a obra, em seu conjunto, ganhou o prêmio Camões por ser uma contribuição relevante para o nosso patrimônio cultural imaterial, que é a Língua Portuguesa.