O brasileiro não tem memória.

Neste blog desmascaramos esta mentira.









quarta-feira, 27 de maio de 2015

Diálogo surreal (9): lembrando dos amigos

Eu:  Oi, Fulano, tudo bem?
Amigo:  Quem fala?
- Fabiana, Fulano.
- Que Fabiana? Qual delas?
- Fabiana Dantas, sua amiga há mais de 15 anos. (Puf)
- ...   Fabiana Dan...Oi, Fabi! FABI! FAAABI!
-  Essa uma aí mesmo.
-  Tudo bem, Fabi?
-  Tudo ótimo, liguei para saber como vai você.

 ... (silêncio esquisito)

- Alô, Fulano, estás aí?
- Estou sim, só estou matutando para descobrir por que você ligou para mim.
- Ué, liguei para saber como está, já que fazia tanto tempo que não falava com você.  Eu não esqueço dos amigos.
- Diga a verdade, Fabiana.  Você está sabendo de alguma coisa?
- Eu?  Não, estou tentando saber como você está.
- Já sei, você sonhou comigo.  No seu sonho, por acaso, eu estava morrendo?
- Como é?
- Você teve um pressentimento comigo, não foi? Mas será que é algo ruim que vai acontecer?
- Pressentimento?  Eu não sinto essas coisas, Fulano, tá maluco?
- Confesse, eu estou morrendo, não é?  É isso que você quer me dizer?
- Fulano, eu fiz uma lista de pessoas que não falava há algum tempo e de quem tinha saudades, e você está na lista.
- MEEU DEEUS! Eu estou na lista. E agora?!  Será que eu estou morrendo?

Parei, pensei um pouco e disse:  Olha, querido amigo, vamos fazer o seguinte.  Na próxima semana eu vou te ligar para agendar uma data para ligar para você, e então perguntar como você está, ok?  Melhor, me dá o telefone da tua mãe e eu pergunto para ela.

- É assim, já vai correndo contar tudo para minha mãe?  É pior do que eu pensava.

sábado, 23 de maio de 2015

Fetiche do princípio

Um fetiche é uma idéia, desejo ou comportamento baseada no fascínio por algum objeto ou procedimento, que enfeitiça as pessoas.  Aliás, a palavra fetiche e feitiço têm a mesma origem.

Para algumas pessoas, como eu, o começo, a raiz, o arquétipo são especialmente fascinantes porque é na origem (sonhamos), que se encontram as verdadeiras causas e explicações, o verdadeiro poder.

Pensando em fetiche do princípio, não há como esquecer da mítica moedinha nº 1 de Tio Patinhas. De nada valiam para ele e para mim todas as outras moedas da piscina-cofre, mas era a primeira, a origem, que tinha o verdadeiro valor.

Gosto muito de utilizar o dito "o que começa errado, termina errado", para ilustrar as consequências funestas dos maus começos. Tentar fazer tudo certo desde o princípio para que tudo se desenvolva da melhor maneira possível, pois "pau que nasce torto, nunca se endireita".

Enfim, eu sei que a origem é só um momento da existência, e que a "semente não explica a árvore", como afirma Ginzburg. Mas seria esse o momento mais importante? Ou será que importâncias dependem primordialmente do contexto?

O certo é que esse fetiche atrapalha a minha vida algumas vezes.  Por exemplo, não consigo começar a ler um livro pelo meio, mesmo que os capítulos sejam independentes.  Se perco o início de um filme não continuo assistindo, espero a próxima oportunidade.

Quando estou estudando, tenho que fazer uma revisão do que foi visto antes de adentrar em novos e misteriosos desdobramentos (olha só a manifestação do fetiche http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2011/07/memoria-1.html).  É por isso que tento fazer fichamentos completos, porque senão jamais conseguiria avançar nos meus estudos.  Mas tudo bem, acredito que revisar, reviver e relembrar são muito importantes no aprendizado.

De fato, como dizia Confúcio (CONFÚCIO, 1995, p.7), "Aquele que está sempre revendo seus velhos conhecimentos e adquirindo novos poderá tornar-se um professor para os outros".

Voltando à idéia original deste post (hehehe), acredito que o passado e a memória são um fascinante material para reflexões e talvez essa seja a raiz do meu interesse nessa área. 


Referência

CONFÚCIO. The Analects. New York: Dover, 1995


domingo, 17 de maio de 2015

Aniversário do blog "Direito à Memória":reflexão do lustro

Hoje, dia 17/05/2015, o blog "Direito à Memória" completa cinco anos - um lustro!- porque nessa data publiquei o primeiro post (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2010/05/capitulo-1.html).

O motivo pelo qual decidi criar este blog, mesmo sem ter a menor idéia do que era isso, foi continuar a refletir sobre o tema memória e o direito correspondente, que tem preenchido a minha existência nas últimas décadas, em um lugar específico e próprio para refletir, manifestar minhas opiniões e discutir com quem se interessa pelo tema.

Esse blog é o meu edifício da memória, o meu locus.  Percorro os seus corredores e labirintos, vou aos marcadores como se fossem cômodos e aí posso reler e relembrar idéias, fatos, comentários.  Podemos acompanhar situações que se protraem no tempo, como a Revolução (será?) no Egito, o processo de queda de Kadhafi, ou apenas deixar o pensamento vagar através dessas diversas possibilidades que a memória admite: patrimônio material, imaterial, memórias individuais de sentimentos, impressões, viagens.

É também uma chance de olhar o que acontece à minha volta, no Brasil e em outros lugares e povos, e tentar entender comparativamente algumas experiências.  Tento entender e explicar a minha circunstância a partir da experiência da "mesma Humanidade noutros pontos", como diria Fernando Pessoa, e também noutros tempos.

Confesso que não é tarefa fácil, a realidade é diversa e complexa demais, e certamente não vou conseguir encontrar hipóteses, teorias e doutrinas que a expliquem satisfatoriamente, porque "a Arte é longa e a vida é breve". O que importa é a busca, não necessariamente o resultado, e a memória dá o conforto da continuidade.

Um lustro é uma ótima oportunidade para comemorar e refletir.  Nesse tempo,  e 885 posts depois, fiz tantas coisas, vi tantos lugares, pessoas diferentes e interessantes, todas essas experiências processadas e transformadas em memórias que enriquecem o indivíduo.  Ainda me interessa escrever e pensar aqui, e o blog já se incorporou na minha rotina diária, mesmo que não publique posts todos os dias por questões de tempo e inspiração.

Quando vejo alguma notícia pertinente, a minha primeira idéia é discuti-la aqui, como faço na sala de aula. Os meus amigos e familiares também se envolveram e sempre me dão indicações do que poderia postar, e percebo que alguns temas suscitam bastante interesse e , espero, também questionamentos e reflexões.

Neste aniversário, gostaria de agradecer especialmente àquelas pessoas que intencional ou acidentalmente visitam o blog.  É muito bom perceber que a memória é tão importante e suscita interesse para tanta gente.

Um abraço,

Fabiana

sábado, 16 de maio de 2015

Lembrar Jacques-Louis David

Sempre que leio um livro, ouço música, vejo quadros ou espetáculos, penso que os autores foram pessoas comuns, com problemas e circunstâncias tão mundanas, e procuro perceber isso nas suas obras.

Nessa semana estava estudando sobre iconografia política (e sua influência na memória, é claro), quando me dei conta de que as imagens que eu tenho da Revolução Francesa são a visão de um homem, o deputado e pintor David (1748-1825).

Lembrando dos meus livros de História na época da escola, são os seus quadros que ilustram o evento. "O último suspiro de Marat", quadro famosíssimo,  até a sagração de Napoleão. Em uma breve vida humana, ele conseguiu ser testemunha privilegiada da História, participou da Revolução Francesa, assistiu à ascensão de Napoleão Bonaparte ao poder, e foi capaz de criar documentos históricos que nos permitem entrever como os fatos aconteceram.

Evidentemente, devemos analisar as declarações (pintadas) do artista com cautela e, em uma primeira análise, tentar abstrair a sua motivação política e parcialidade evidente.  E, em segunda análise tentar contextualizá-las, porque também são uma importante fonte de informação.

David, para mim, foi um gênio da propaganda política.  Acredito que conseguiu comunicar muito bem, através da suas imagens e ações, as suas idéias sobre heroísmo, nação, sacrifício, política.  Embora não seja um dos meus pintores favoritos (tenho amores variados em época, estilo e escolas, se é que podemos rotular artistas assim), reconheço que suas obras explicam uma época, e marcaram profundamente a minha memória.

Lembrar Jacques-Louis David é saber que a arte é uma forma de comunicação poderosa e nunca é neutra.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

terça-feira, 12 de maio de 2015

Butão: modo de viver peculiar

Ontem me deparei com uma reportagem interessante sobre o Butão, um intrigante Estado que cultiva a felicidade, e o segredo do seu sucesso: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/05/150504_vert_tra_butao_felicidade_ml?ocid=socialflow_facebook.

Segundo a análise do autor da reportagem, os butaneses são felizes porque pensam na morte até cinco vezes por dia.  Afirma-se que as sociedades ocidentais estão doentes de ansiedade, depressão e pânico porque houve um incompreensível distanciamento da morte.

Concordo parcialmente.  A morte coloca a vida em perspectiva e nos permite valorizar o que realmente é importante. Mas na nossa sociedade os velórios estão cada vez mais rápidos (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/03/beber-o-morto.html), os cemitérios estão cada dia mais provisórios (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/08/cemiterio-lugar-de-memoria.html), e a aproximação com a morte é feita com temor e indiretamente, como se tivéssemos medo de contemplar a natureza.

Em uma sociedade violenta como é a nossa, onde os números dos homicídios e acidentes de trânsitos superam quaisquer guerras (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2011/04/dever-de-memoria-homicidios-no-brasil.html) é surpreendente que a morte seja quase invisível (ou será que é a vida?), e que as tentativas de enganá-la resultem em uma infrutífera busca pela fonte da juventude aparente.

Os rituais funerários poderiam ser utilizados para dar significado à vida, assim como servem para organizar o futuro dos mortos.  É claro que algumas crenças também facilitam esse processo, especialmente se há reencarnação, ou um lugar como o paraíso como destino.

Eu, particularmente, acredito que "imortalidade" é a memória exercitada.  Sobrevivemos na memória dos vivos, enquanto formos lembrados.

Mas é claro que não basta a consciência da fugacidade da vida para ser feliz, ainda que o "memento mori" seja útil e eticamente fundante.  Atender as necessidades do corpo e da alma também são pré-requisitos para a felicidade, ainda que fortemente condicionadas ou limitadas pela idéia da morte, perante a qual alguns desejos são inúteis.

Enfim, pensar na morte é na verdade pensar na própria vida, e em que medida ela faz e tem sentido.  Então, concluo com um provérbio que a internet afirma ser aborígene, mas se não for vale porque é belo e sábio: "somos todos visitantes deste tempo, deste lugar, Estamos só de passagem.  O nosso objetivo é observar, crescer e amar.  E depois vamos para casa".

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Coquinho de licuri

É o fruto de uma palmeira que cresce nos sertões do Brasil, especialmente da minha região.

Lembro de que, quando eu e meus irmãos éramos apenas filhotes, meu pai trazia de suas viagens colares feitos com esses coquinhos torrados, colocava-os nos nossos pescoços, e nos soltava nos parques e praças para brincar.

À medida que ficávamos cansados e com fome, era só pegar um pedaço do colarzinho e comer o coquinho, o que nos dava um tempo de autonomia de brincadeiras muito maior.  Basicamente, só parávamos de correr e gritar para tomar água, e ao final do dia a gente só queria ir para casa e dormir.

Esse é outro dos sabores da minha infância.


domingo, 10 de maio de 2015

Mamãe

Minha mãe - direitoamemoria.blogspot.com.br

quinta-feira, 7 de maio de 2015

China quer proibir performance de strippers em funerais

Confira a notícia: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/05/150506_china_strippers_funerais_lgb.

Segundo a reportagem, contratar shows de striptease é uma forma de atrair público para os funerais, para dar a impressão de que o falecido era muito querido.

No Brasil, ainda não vimos tal prática, mas o striptease é relativamente comum em despedidas de solteiro e chás de panela (http://direitoamemoria.blogspot.com.br/2013/02/cha-de-panela-reflexao-etnografica.html).

E aí?  Striptease em funerais é uma forma de lembrança celebrativa da memória dos mortos?

terça-feira, 5 de maio de 2015

Direito à memória dos mortos: adoção para funeral

Hoje me deparei com a notícia de que uma chilena,  Sra. Bernarda Gallardo, adota bebês mortos para poder proporcionar um funeral digno, cf. http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/05/150427_chilena_bebes_lab.

De acordo com a notícia, a Sra. Gallardo faz isso para evitar que os restos mortais sejam tratados de maneira indigna, porque aparentemente pela lei chilena se um cadáver não é reclamado, é tratado como dejeto (segundo a reportagem). Já adotou três bebês, e agora tenta adotar o quarto.

Não conheço a legislação chilena, e nem os motivos que levaram a Sra. Gallardo a agir especificamente assim, através da adoção, mas acredito que há meios legais menos difíceis para atingir o mesmo objetivo.

Observe-se a atuação da Irmandade da Misericórdia e de São Roque de Lisboa: da http://www.cmjornal.xl.pt/nacional/sociedade/detalhe/irmandade_em_lisboa_fez_funerais_de_criancas_de_quem_ninguem_reclamou_o_corpo.html.

No Brasil, não se poderia adotar um bebê falecido.  O tratamento digno dos restos mortais pode ser ofertado pela família, entidades privadas ou pelo Estado, sem a necessidade de recorrer a esse caminho jurídico.  Se considerarmos também as dificuldades para adotar no Brasil, então...

De toda maneira, fica o registro da atuação e da preocupação da Sra. Gallardo com pessoas que não tiveram nenhum amparo em vida.

sábado, 2 de maio de 2015

Terremoto em Kathmandu, Nepal, 2015

O terremoto que atingiu a cidade de Kathmandu e adjacências, no Nepal, assumiu os contornos de uma imensa tragédia humana.  Além das quase sete mil mortes, e desalojamento de mais de três milhões de pessoas, aproximadamente 68 lugares considerados patrimônio foram danificados, e alguns completamente destruídos (Cf. http://mashable.com/2015/05/02/nepal-earthquake-damage/).

Infelizmente, parece que os terremotos são frequentes nessa região. Lembro que há alguns anos houve um grande terremoto na região (2012), e encontrei vários relatos e até um pequeno histórico sobre o assunto: http://xnepali.net/movies/earthquake-history-of-nepal/ .

Lembrarei e rezarei por todos.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Sabor perdido da infância

Quando era pequena, comi uma frutinha vermelha e adorei.  Nunca mais a encontrei, mas também nunca a esqueci.

Ela tem um formato de gota, e quando está madura fica bem vermelhinha. O gosto é bem peculiar, não sei definir.  Infelizmente, é uma dessas frutas que não são vendidas em mercado e nem estão na moda, então encontrá-la é realmente um golpe de sorte.

Ontem, o meu marido estava estudando sobre frutas e resolvi perguntar se ele conhecia essa frutinha da minha infância.

- Como é o nome, ele perguntou.
- Não sei.
- Qual o formato?
- Tem forma de gota, e quando está madura é bem vermelhinha.
- Onde você comeu? No Brasil?
- Não lembro, eu era muito pequena.
- Certo, vou dar uma pesquisada e se eu encontrar alguma coisa te digo.

Mais ou menos uns quarenta minutos depois, eu estava lavando os pratos do almoço e ele me chamou:

- Fabiana, olha essa foto.  É a sua frutinha?
- É sim!  Como você achou?!
- O nome é caferana.
- Meus Deus!  O meu amor tem um nome: caferana!
- Pensei que o nome fosse Marcelo...
-É também, claro. Caferana, quem diria....Que pena que não dá para comprar.  Ela não vende em mercado.
- No nosso sítio tem três pés dela.  E estão carregados de frutinhas.  Vou trazer para você hoje.

Como??? No sítio tem três pés de caferana e eu nunca as tinha visto?  Como isso é possível?

Para concluir a história, de noite quando voltou no trabalho do sítio ele trouxe um punhado de caferanas vermelhinhas para mim,  E eu comi bem devagar, como se saboreasse uma lembrança. Reencontrei um sabor perdido da minha infância, e fiquei muito emocionada.

Infelizmente o encanto foi quebrado quando o meu marido fez o seguinte comentário:

- Que negócio ruim.  Nem passarinho come essa tua fruta, elas estragam no pé.